Late Hopping: Nem só de Dry Hopping vive uma IPA

Foi com essas palavras que Alexander Weckl, mestre cervejeiro da Agrária Malte iniciou sua palestra no Congresso Técnico Internacional Agrária Malte.

Foram 5 dias de conhecimento com importantes tópicos sobre o processo cervejeiro com palestras apresentadas por especialistas da Agrária e profissionais do setor.

Late Hopping – Complexidade para sua IPA traz informações importantes sobre a adição tardia de lúpulo, uma técnica utilizada normalmente para conferir aroma e sabor à cerveja. Segundo Alex Weckl, a dosagem tardia de lúpulo é tão importante para a complexidade de aromas numa IPA quanto é o processo de Dry Hopping. Acompanhe abaixo os estudos desenvolvidos pelo mestre cervejeiro e entenda os efeitos desse processo nos compostos de aroma e amargor de lúpulo nas cervejas.

Para assistir à apresentação de Alex inscreva-se em https://www.congressotecnico.com.br/

 

Alexander Weckl,
mestre cervejeiro da Agrária Malte

A dosagem tardia de lúpulo é uma técnica utilizada,
normalmente, para conferir aroma e sabor à cerveja

Alexander Weckl

Consideramos para este artigo dosagens tardias de lúpulo as dosagens na fase quente (fim de fervura e whirlpool) que têm como objetivo principal conferir aroma e sabor à cerveja, mantendo os compostos mais voláteis em detrimento de rendimento de isomerização de alfa ácidos. No caso da tradução literal “late hopping”, esta se refere normalmente à dosagem de whirlpool.

Vamos entender os efeitos dessas dosagens nos compostos de amargor e aroma de lúpulo na cerveja.

Amargor na dosagem tardia

É sabido que quanto maior o tempo de fervura, maior é a taxa de isomerização e consequentemente de rendimento de amargor do lúpulo. Isso significa que ao serem realizadas dosagens mais tardias, há uma tendência de produzir uma quantidade menor de iso-alfa-ácidos. Porém não necessariamente uma cerveja menos amarga!

Por muitos anos a única base de cálculo para dosagem de amargor foi a taxa de conversão de alfa-ácido em iso-alfa-ácido. Porém com a popularidade e busca de cervejas cada vez mais aromáticas e dosagens tardias com o intuito de preservar os compostos mais voláteis, foi observado que mesmo com uma porcentagem baixa de compostos de amargor iso-alfa, se obtinha uma cerveja amarga.

Para entender isso, é preciso entender o que é IBU (InternationalBitterUnits). Este valor é medido seguindo a metodologia EBC 9.8 que identifica compostos de amargor por espectofotometria a 275nm, ou seja, é uma medição não específica. Por não ser específica, mede iso-alfa-ácidos e também outros compostos de amargor conforme pode ser observado nos gráficos da figura 1.

 

Figura 1. Espectofotometria de Humulinonas e Iso-humulonas.
Fonte: Ferreira et. al, ASBC Journal, 75, 04/2018

 

São vários os componentes do lúpulo que compõe o IBU da cerveja que não são iso-alfa-ácidos e que interferem diretamente no amargor da cerveja. As Humulinonas (compostos oxidados de alfa-ácidos) e também os beta-ácidos e os compostos derivados destes como as huluponas (compostos oxidados de beta-ácidos) são os principais responsáveis pelo amargor não iso-alfa-ácido.

Nos gráficos seguintes, pode ser observada a relação IBU/Iso-alfa-ácido na cerveja com a relação beta/alfa-ácido do lúpulo e também a correlação com qualidade de amargor.

Estas substâncias de amargor têm pouca influência quando consideramos a dosagem de lúpulos de amargor no início da fervura, porém dosagens intensas de lúpulos de aroma em dosagens tardias podem mudar consideravelmente o resultado de amargor em relação ao calculado e também a percepção de qualidade deste amargor.

Por muito tempo não se considerava ganhos em amargor nas dosagens de Whirlpool pois a taxa de isomerização apesar de ocorrer até 70ºC, diminui exponencialmente a cada grau centígrado. Mesmo com pouca isomerização, os demais compostos possuem alta solubilidade e são significativos na composição do IBU.

 

Gráfico 1. Correlação IBU:IAA e b:a.
Fonte: Schüll, Florian. Workshop de Cervejas Especiais Agrária Malte, 2018.

Gráfico 2. Correlação Qualidade de Amargor e b:a.
Fonte: Schüll, Florian. Workshop de Cervejas Especiais Agrária Malte, 2018.

 

Gráfico 3. Solubilização de lúpulo no Whirlpool.
Fonte: Justus, A., Tracking the IBU through the Brewing Process, MBAA
TQ 55:69 74, 2018.

 

 

Polifenóis na dosagem tardia

Mesmo em dosagens tardias, a solubilização de polifenóis do lúpulo é significativa e pode chegar a 60%. Portanto este composto deve também ser levado em consideração.

Os polifenóis de lúpulo são responsáveis por complementar o sabor lupulado e ter efeito positivo no corpo da cerveja, além de contribuir para a qualidade de amargor.

 

Gráfico 4. Correlação entre concentração de polifenóis e qualidade de amargor na cerveja.
Fonte: Schüll, Florian e Forster, Adrian. As causas da explosão de novas variedades de Lúpulo e como se orientar nesse ambiente. Workshop Agrária Malte 2018.

 

Além do efeito de amargor e corpo, os compostos fenólicos possuem efeito antioxidante, podendo assim beneficiar a estabilidade sensorial da cerveja.

Aroma na dosagem tardia

O potencial de aroma lupulado da cerveja é definido pela composição dos óleos essenciais e pelos ésteres provenientes do lúpulo. Os óleos podem ser divididos em 4 grandes grupos, os monoterpenos, sesquiterpenos, álcoois monoterpênicos e tióis.

 

Figura 2. Ação da b-lyase.
Fonte: Lallemand Brewing – Best Practice Biotransformation

Parte destes tióis estão presentes no mosto lupulado como precursor não aromático pois estão ligados à cisteína. Durante a fermentação, algumas cepas de levedura possuem a habilidade de quebrar esta ligação, liberando assim o aminoácido cisteína e o thiól aromático. Esta quebra acontece por meio de uma enzima chamada b-lyase secretada pela levedura. O gráfico 5 relaciona algumas leveduras e seu potencial enzimático de b-lyase e também b-glucosidase, uma enzima que será mencionada a seguir.

 

Gráfico 5. Atividade de Biotransformação de leveduras LalBrew®. Fonte: Lallemand Brewing – Best Practice Biotransformation

 

Mas os principais compostos aromáticos são os álcoois monoterpênicos, principalmente o Linalol (floral e frutado) que é considerado o principal composto aromático do lúpulo. O gráfico 6 mostra a relevância do Linalol para o aroma da cerveja.

Gráfico 6. Atividade de Biotransformação de leveduras LalBrew®. Fonte: Lallemand Brewing – Best Practice Biotransformation

 

Além do Linalol, outro álcool monoterpênico é bastante importante em lupulagens tardias, principalmente quando falamos de altas dosagens. Este composto é o Geraniol (floral, rosas, gerânios), que pode ser encontrado no lúpulo na sua forma livre ou como precursor ligado à um glicosídeo ou na forma de éster geranílico. A proporção é variável entre cada variedade de lúpulo.

Durante a fermentação, o Geraniol é transformado na sua grande parte em outros compostos, um deles é em b-citronelol, composto com aroma cítrico. Este comportamento pode ser observado na figura 3.

 

Figura 3. Biotransformação de álcoois monoterpênicos por leveduras.
Fonte: Takoi, K. Systematic Analysis of Behaviour of Hop-Derived Monoterpene Alcohols During Fermentation and New Classification of Geraniol-Rich Flavour Hops.

 

Neste mesmo estudo foi observado que algumas variedades de lúpulo com quantidade baixa de geraniol livre obtiveram um aumento de concentração de b-citronelol. Estas variedades são caracterizadas como lúpulos dominantes em precursor de Geraniol. Estes precursores podem ser ésteres geranílicos e também geraniol ligado a glicosídeo, esta ligação faz com que este composto seja não aromático.

O gráfico 5 mostra a atividade enzimática de b-glucosidase de algumas cepas de levedura. Esta enzima é responsável pela quebra da ligação entre o monoterpeno e o glicosídeo, liberando o composto aromático para possíveis futuras reações (figura 2). Atualmente já é possível adquirir esta enzima comercialmente para cerveja e uma das vantagens além de modificar o perfil sensorial da cerveja, é intensificar o aroma de variedades com porcentagem maior de precursor (Figura 4).

 

Figura 4. Comparativo de álcoois monoterpênicos (linalol, geraniol, b-citronelol) durante fermentação de cervejas com adições tardias de lúpulos; F: fermentação; S: armazenamento.
Fonte: Takoi, K. Systematic Analysis of Behaviour of Hop-Derived Monoterpene Alcohols During Fermentation and New Classification of Geraniol-Rich Flavour Hops.

Figura 5. Comparativo de álcoois monoterpênicos (linalol, geraniol, b-citronelol) durante fermentação de cervejas com adições tardias de lúpulos; F: fermentação; S: armazenamento.
Fonte: Takoi, K. Systematic Analysis of Behaviour of Hop-Derived Monoterpene Alcohols During Fermentation and New Classification of Geraniol-Rich Flavour Hops.

Além dos ésteres geranílicos, outros ésteres de lúpulo também são importantes na composição aromática da cerveja. Um exemplo são os ésteres Isobutíricos que podem ter aromas de maça e damascos. Normalmente bastante instáveis durante a fervura, é interessante que a busca destes compostos se faça na dosagem de whirlpool.

Referências

1. Ferreira et. al, ASBC Journal, 75, 04/2018
2. Schüll, Florian e Forster, Adrian. As causas da explosão de novas variedades de Lúpulo e como se orientar nesse ambiente. Workshop AgráriaMalte 2018.https://www.agraria.com.br/malte/biblioteca-digital/82
3. Justus, A., Tracking the IBU through the Brewing Process, MBAA TQ 55:69 74, 2018.
4. Lallemand Brewing – Best Practice Biotransformation. https://www.lallemandbrewing.com/wp-content/up loads/2020/08/LAL-bestpractices-Biotransformation 2020.pdf lúpulo

Alexander Weckl
Especialista de mercado da Agrária Malte, mestre cervejeiro e biersommelier

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