As cervejas especiais seguem em ritmo de crescimento gerando oportunidades para toda cadeia de abastecimento
Com uma redução de quase 2% na produção em 2015, as cervejarias terão que repensar suas estratégias para não acontecer o mesmo em 2016. Tarefa nada fácil em um ano que indica inflação alta, retração do PIB em cerca de 2,5%, instabilidade política e apetite do Governo por impostos cada vez maior, fora a queda do poder aquisitivo do brasileiro que faz o consumo despencar.
Em janeiro, segundo dados do Sicobe, a produção da indústria brasileira de cerveja atingiu 12,927 milhões de hectolitros ante 13,026 milhões produzidos no mesmo período do ano anterior. Apesar das dificuldades, as crises estão aí para serem superadas e gerenciar problemas é a principal tarefa de todo executivo. Portanto, vamos atrás das oportunidades porque ficar se lamentando não aumenta o faturamento de ninguém.
Verão
O Carnaval já no início de fevereiro deve garantir um trimestre melhor, se as chuvas não atrapalharem. Só para citar um exemplo de como a data é extremamente importante para o setor, o Pão de Açúcar realizou promoção de cervejas especiais na sexta-feira de Carnaval e os resultados foram muito bons. As vendas aumentaram 94 % na categoria de cervejas especiais, provocando também aumento de vendas em toda categoria de cervejas com alta de 83 %, enquanto as bebidas em geral, incluindo não alcoólicos, cresceram 34% na semana de Carnaval em comparação ao mesmo período do ano passado.
Promoções desse tipo alavancaram as vendas de cervejas em fevereiro em todas as regiões do País e devem se repetir até o final do verão. Aliás, o que se viu no Carnaval foi uma tremenda guerra de preços nos pontos de vendas entre as grandes marcas. Todas, sem exceção, baixaram os preços e apostaram na desova de estoques. Em épocas de ‘vacas magras’ alguns formatos de embalagens ganharam mercado nessas promoções, caso dos latões de 550 ml. Outro formato muito utilizado nas promoções é a latinha de 269ml, a chamada ‘rapidinha’. Uma embalagem que parece ter caído no gosto do consumidor e que já faz parte do portfólio de combate das grandes marcas.
Valor
No entanto, nem só de volume vive uma cervejaria, é preciso ter margem. E, para isso, as cervejas especiais são a bola da vez. Marcas importadas como Estrela Gallicia e Amstel começam a ganhar mais espaço nos pontos de vendas, enquanto a Heineken reina soberana com preço levemente superior a Budweiser. Só para explicar, são consideradas cervejas especiais (por alguns institutos de pesquisa) aquelas marcas vendidas com preço cerca de 20% maior que as cervejas mainstream como Skol, Itaipava etc.
O investimento nas cervejas especiais é uma boa alternativa para aumentar a rentabilidade do setor.
O brasileiro está gostando da ideia de experimentar novas cervejas, mesmo que tenha que pagar um pouco mais por isso. As grandes cervejarias estão lançando novos sabores e embalagens em formatos diferenciados para conquistar esses consumidores. No Carnaval a espanhola Estrela Gallícia colocou no mercado cerca de 200 mil garrafas de 600 ml em uma edição temática.
Em janeiro, a Itaipava Pilsen, mainstream do Grupo Petrópolis, também lançou uma edição temática com uma lata exclusivamente criada para a Cidade Maravilhosa. A nova embalagem traz figuras de objetos indispensáveis no dia a dia de quem vai à praia durante o verão: raquete de frescobol, óculos de sol, bola, remo de stand up, pé de pato, chinelo de dedo, o calçadão, entre outros. Em aplicações delicadas, a lata fosca mantém as cores da Itaipava (vermelha e branca), mescladas a detalhes dourados.
Algumas microcervejarias também aproveitaram a folia para lançar novos produtos, como foi o caso das cervejarias Blondine e Nacional que juntas lançaram o rótulo Pé na Areia, cerveja do estilo American Pale Ale com adição da brasileiríssima fruta caju. Pé na Areia é uma cerveja leve, clara e com baixo teor alcoólico (4,6%). O lúpulo e o caju transmitem à bebida um amargor e uma acidez extremamente refrescantes.
Historicamente, o Brasil sempre foi um país em que a indústria cervejeira estava voltada para a produção em larga escala. Nossas cervejas foram desenvolvidas com receitas de produtos leves e refrescantes, com estratégias de negócios para a grande massa, sem grandes características de diferenciação.
O universo da cerveja no Brasil é composto de 98,2 % de cervejas mainstream e o restante (1,8%) de cervejas especiais, sendo que essas especiais se dividem em importadas (1%) e as artesanais(0,8%). Nos últimos cinco anos os sinais de mudança começaram a aparecer com a redução do volume consumido e a procura por produtos de maior valor agregado, fazendo uma transição no mercado na relação volume e valor. Em 2013, o mercado de varejo apresentou uma queda de volume de 2,3%, enquanto alcançou um crescimento de valor de 13%. Ano passado tivemos uma queda na produção de mais de 2%, mesmo assim as cervejas especiais continuaram aumentando as vendas.
Expansão
Esses produtos já representam cerca de 11% no Brasil e a quantidade de marcas e variações ainda é pequena quando comparada aos Estados Unidos e Europa. Marcas como Heineken e Budweiser foram grandes beneficiadas nesse processo de premiunização que atingiu o Brasil nos últimos anos. Tanto Heineken quanto Ambev ampliaram seus portfólios de importadas e melhoraram suas margens de rentabilidade.
A Heineken Brasil anunciou seu plano de expansão com o objetivo de reforçar sua participação no país e atender demandas específicas. Somados os valores, a cervejaria está investindo em 2016 mais de R$1 bilhão em três grandes projetos que visam ampliar sua competitividade, gerando mais versatilidade para as linhas de produção, criando outras categorias de embalagens e novas opções de logística favoráveis ao escoamento da produção para diversos mercados.
Entre os investimentos está a construção de uma nova cervejaria na cidade de Itumbiara, em Goiás. A nova unidade vai receber investimentos de R$ 650 milhões com operação prevista para o início de 2018, e uma capacidade de produção de 3,5 milhões de hectolitros por ano. Inicialmente, o foco será nas marcas Kaiser, Kaiser Radler, Sol Premium, Bavaria, Desperados e Heineken.
Além do investimento na planta de Jacareí, realizada ano passado, outra ampliação está acontecendo na cervejaria de Ponta Grossa que recebeu investimento de R$ 241 milhões para dobrar sua área construída com novas linhas de Heineken, Sol Premium e Kaiser Radler e tanques de fermentação ampliando sua produção em 1,4 milhão de hectolitros por ano.
A Ambev também mantém seus planos de investimentos no país e depois da compra da britânica SABMiller no ano passado, a empresa deve aumentar o portfólio de especiais importadas no Brasil. O novo grupo terá á disposição, além das marcas já comercializadas como a americana Budweiser e a belga Stella Artois, pertencentes à AB InBev, a italiana Peroni, a tcheca Pilsner Urquell e a holandesa Grolsch da SABMiller.
No Brasil, a Ambev já mostrou seu apetite por esse mercado, comprando as microcervejarias Walls e Colorado, além de aumentar consideravelmente os investimentos na Bohemia, linha dedicada às cervejas especiais no país.
Cervejas artesanais
Com o crescimento do mercado de cervejas especiais surgem oportunidades para empreendedores grandes e pequenos nos diversos segmentos relacionados ao produto.
O mercado de cervejas no Brasil nunca mais será o mesmo depois do movimento das cervejas artesanais. E, com certeza, será muito melhor.
O consumidor tem, agora, à sua disposição uma variedade de sabores e estilos nunca antes imaginado. É bom demais para ser verdade. E a tendência é só de aumentar. As cervejas artesanais ainda têm enorme caminho a percorrer no Brasil, por enquanto representam cerca de 0,8% do mercado, mas fazem parte de um movimento que contribui para o aumento das vendas de todas as cervejas especiais. Movimentam também o mercado dos cervejeiros caseiros, os chamados homebrewers, que fazem surgir novos negócios.
A definição para craft beer, segundo a Brewer Association, é um negócio pequeno, independente, tradicional e inovador. Geralmente produz suas cervejas com ingredientes tradicionais e que podem levar a adição de ingredientes exóticos e que diferenciam o produto das cervejas industriais. Também trabalham muito o mercado regional.
Muitos desses cervejeiros caseiros transformam-se nas microcervejarias que espalham-se por todas as regiões brasileiras. Atualmente, o País já conta com mais de 300 dessas pequenas empresas que lançam produtos inovadores e muitos com características típicas de suas regiões de origem utilizando ingredientes como açaí, caju, rapadura, jabuticaba, entre tantos outros. Essa indústria estimula o consumo de maltes especiais, lúpulos, equipamentos, embalagens, acessórios e serviços demandados para fabricação dos produtos. A inovação proposta por essas microcervejarias que buscam incessantemente novas receitas faz surgir profissionais altamente capacitados, além de processos e sistemas de produção diferenciados e modernos, adaptados às nossas necessidades e peculiaridades de mercado.
As microcervejarias buscam diferenciais que possam ajudá-las a aumentar suas vendas e reduzir custos de produção. A Cervejaria Edelbrau, de Nova Petrópolis (RS), investe em processos sustentáveis para fabricação de seus produtos e os resultados desses esforços começam a aparecer. O sistema de reaproveitamento da água usado no resfriamento do mosto, mistura de malte com outros componentes, alcançou nível zero de desperdício do recurso natural que antes seria descartado. “A água utilizada para resfriar a mistura volta para os tanques de armazenamento com temperaturas elevadas e lá permanece até atingir a temperatura ambiente. Logo que isso acontece, o ciclo é reiniciado”, explica Fernando Maldaner, um dos sócios da cervejaria.
Para limpeza em geral e irrigação das plantas, a Edelbrau instalou cisternas com capacidade de 20 mil litros que captam a água da chuva. A ideia de Maldaner é ampliar as ações ao longo de 2016. “A intenção é realizarmos um trabalho contínuo na parte de sustentabilidade, reduzindo o consumo energético até chegarmos ao ponto de gerar boa parte da nossa energia com a ajuda de tecnologias como painéis solares fotovoltaicos”, afirma.
A distribuição é um dos principais fatores para o sucesso de um negócio na área de cervejas. Disponibilizar o produto de acordo com as necessidades do consumidor não é tarefa simples, principalmente em um país do tamanho do Brasil e com uma malha rodoviária extremamente comprometida. Buscando alternativas para levar seu produto ao consumidor, a cervejaria paranaense Way Beer lançou em janeiro seu carrinho de chope, que roda a cidade de Curitiba com cervejas fresquinhas.
Um dos grandes destaques do carrinho de chope da Way Beer, que leva a assinatura “Take a Way”, é a cerveja Summer Ale. Ela leva levedura Saison, lúpulos Mosaic e Sorachi Ace e é maturada com lima da Pérsia.
Versatilidade
As artesanais crescem no mercado nacional, mas ainda têm um horizonte de oportunidades a conquistar. Resultado de consumidores mais exigentes é que o aumento de marcas, estilo e sabores só tende a aumentar. Assim como a IPA ganhou espaço entre as cervejas artesanais no Brasil, parece que o estilo da vez agora é a Witbier. Várias cervejarias apostam nele. Uma cerveja produzida com limão siciliano, capim limão e camomila. Este é o mais recente lançamento da Way Beer no mercado. Inicialmente lançada em chope em 2015, a Witbier ganhou destaque em eventos cervejeiros ao redor do país. Agora, a cerveja chega ao mercado em garrafas de 310ml.
Seguindo o tradicional estilo belga, a Witbier da Way Beer é uma cerveja condimentada, cítrica e aromática, que apresenta 17,2 IBU e um teor alcoólico de 5,1%. Além de limão siciliano, capim limão e camomila, a bebida recebeu o lúpulo Sorachi Ace, de origem japonesa, que dá aroma à cerveja. Por levar trigo, a Way Witbier tem uma coloração clara, mas assim como outras cervejas que levam esse ingrediente, ela não é filtrada, processo que deixa a bebida turva, uma característica conferida pela levedura.
Tão ousada nas receitas quanto nos nomes de suas cervejas, a Urbana em parceria com o Empório Alto dos Pinheiros (EAP) desenvolveu a Relaxe e Gose. Disponível em chope e em garrafas de 1 litro, o novo rótulo também contou com a participação do chef René Aduan Junior, da Alma Rústica Gastronomia, que desenvolveu um blend de sais composto de Sais de Rocha Kamienna (Polonês); Sal Rosa do Himalaia (Indiano); Sal azul safira (iraniano) e sal Salzburg (austríaco) com os sais marinhos Flor de sal “Guérande” (Francês); o “Sale Dolce” (italiano) e o Flor de sal “Sale Dei Papi” (italiano). Gose é um estilo com característica de sabor salgado. Daí a importância dessa combinação desenvolvida pelo Chef. A receita inclui Sumac/sumagre, uma planta utilizada pelos romanos e populações do mediterrâneo para condimentar pratos antes da chegada do limão à Europa. Possui sabor ácido e resinoso, complementando o sabor cítrico do coentro e ácido lático da fermentação.
Lançada em fevereiro, a cerveja é produzida na cervejaria Bragantina, com distribuição nacional, enquanto o chope será exclusividade do EAP.