Prevenção e remoção de biofilmes

TanqueAs consequências, como prevenir e remover as camadas de biofilmes que se formam nas partes internas de tubulações e tanques de processamento das bebidas

Julho de 2013

Por Wellington Williams da Silva

A indústria de bebidas é segmentada em diversas categorias: água mineral, sucos, refrigerantes, cerveja, vinhos, bebidas quentes, isotônicos etc. Cada uma delas com suas peculiaridades no que diz respeito aos resíduos de sujidades em tanques de fabricação, tubulações por onde circulam a bebida e seus sistemas de envase após finalização de um processo de produção ou até mesmo troca de sabor.
O sistema operacional comum, mais eficiente e mais produtivo para a limpeza interna de tanques e tubulações, ainda é o sistema CIP.
CIP – Termo inglês (Clean In Place), que se refere a um procedimento, por onde circulam os produtos de higienização, pré-difinido, para a remoção das sujidades internas de tubulações sem que as mesmas sejam desmontadas.
As nossas legislações sanitárias exigem que para o processamento de alimentos sejam utilizados equipamentos, tanques, tubulações e acessórios, fabricados em aço inox AISI 304 ou 316, pois conferem maior segurança na prevenção de contaminações oriundas de resíduos fixados às superfícies destes sistemas. Este conceito é caracterizado devido ao fato destas superfícies (inox) serem compactas e sem porosidade, com excelentes propriedades higiênicas, facilitando inclusive o processo de remoção da sujidade e o efeito de oxidação até mesmo pelo produto processado.
O percentual de bactérias que se fixarão às superfícies dos diversos materiais, tais como plásticos, alumínio, aço esmaltado, e outros materiais, será bem menor numa superfície de aço inox AISI 304 ou 316.
Então, os aços inoxidáveis são largamente usados em aplicações de contato com alimentos. Este uso intensivo se dá devido à resistência à corrosão dos aços inoxidáveis associado à resistência mecânica e à durabilidade, sua característica de ser prontamente higienizado sem deterioração, usando uma vasta gama de produtos de higienização, e o fato de os aços inoxidáveis não modificarem nem a cor nem o sabor dos alimentos e bebidas.
Para efeito de um maior condicionamento passivo deste material, os fabricantes de sistemas de produção e envase de bebidas orientam aos fabricantes que se faça, após o processo de montagem de um tanque ou tubulação de inox, uma passivação do material.
A passivação consiste em acelerar um processo natural em todas as superfícies de inox, em que o cromo presente migra para a superfície na forma de óxido de cromo.
Na liga do aço inoxidável, o cromo é preferencialmente oxidado, e como o produto formado, óxido de cromo (Cr2O3), tem característica protetora, é evidenciada a passivação na superfície do material.
A passivação do aço inoxidável, após o término de todo o trabalho de montagem de um sistema para fabricação da bebida, consiste em fazer uma limpeza CIP com uma solução de produto alcalino para a remoção de graxas e outras sujidades oriundas do trabalho de montagem do sistema. Trata-se da remoção da sujidade orgânica, fundamental para a boa performance do processo de passivação posterior.
Depois que se concluiu esta limpeza bem agressiva no que diz respeito à concentração e ao tempo de circulação da solução de produto alcalino, faz-se circular, através do sistema CIP, uma solução de produto que contenha ácido nítrico na composição, pois o mesmo acelerará o processo de oxidação do cromo e remoção das sujidades de origem inorgânica, tais como o ferro livre, as chamadas zonas anódicas. O processo de passivação com produtos à base de ácido nítrico, tem então duas finalidades: a primeira obter uma superfície quimicamente limpa o melhor possível, e a segunda auxiliar na formação do filme de óxido de cromo.
As principais normas são:
• ASTM A380 – Prática para Limpeza, Desincrustação e Passivação de Peças, Equipamentos e Sistemas de Aço Inoxidável.
• ASTM A967 – Especificação para Tratamentos de Passivação Química para Peças de Aço Inoxidável.
Perfeito, do ponto de vista sanitário, estes procedimentos devem acontecer antes de startar uma fábrica de bebidas, porém o fabricante não deve se descuidar do fator limpeza, pois, mesmo estando com todo o sistema adequado e tendo realizado o processo de passivação, não quer dizer que o mesmo não esteja sujeito a um incidente de contaminação.
Temos vários agravantes, pois um descuido no processo de limpeza pode viabilizar e desencadear um problema seríssimo de contaminação microbiológica, onde as consequências poderão vir a curto ou médio prazos, dependendo da categoria de bebidas processada. Temos bebidas muito ácidas, onde a resistência a uma contaminação é maior, e bebidas menos ácidas onde se verifica uma menor resistência ou, digamos uma maior fragilidade no tocante a um processo de desenvolvimento microbiológico, comprometendo a integridade da bebida envasada. A presença de gás carbônico em determinadas bebidas também viabiliza esta resistência a um desenvolvimento microbiológico. Mas, independente da bebida, o fator quantitativo da carga microbiana pode falar mais alto. Por isso, o velho ditado, “É melhor prevenir do que remediar” ainda é válido.
Estamos falando sobre um problema não muito comum, mas de consequências gravíssimas. Referimo-nos ao Biofilme.
O que é o Biofilme? São sistemas muito complexos que consistem de células microbianas e colônias introduzidas em um gel de um polissacarídeo cuja estrutura e composição são função da idade do Biofilme e das condições ambientais. Os Biofilmes contêm partículas de proteínas, lipídios, fosfolipídios, carboidratos, sais minerais, vitaminas, entre outros, formando uma crosta onde os microorganismos de uma ou mais espécies se desenvolvem. Eles podem ser formados por vários tipos de organismos, incluindo os PATÓGENOS.
É uma camada microscópica, onde os microorganismos se protegem da agressão de produtos de higienização.
A química da formação do Biofilme é complexa, porém é passível de ocorrer em condições nas quais o processo de higienização está falho, pois, à medida que os quatro fatores de higienização (Ação Mecânica, Ação Química, Tempo e Temperatura) estão fora de sinergia, este processo pode desencadear e com o tempo eclodir numa contaminação fora de controle num sistema de processamento de bebida, seja ela de qual categoria for, pois podemos perceber acima que no conceito de Biofilme eles contêm partículas de sujidades comuns a todas as modalidades de bebidas.

Figura1
A química da fixação da sujidade numa superfície é complexa e o processo de limpeza consiste na aplicação de energia a fim de romper as ligações que mantém as sujidades aderidas às superfícies. Esta energia provém do produto químico em questão.
O fator tempo é um problema muito frequente numa indústria de bebidas quando se fala no processo que será elaborado para a limpeza CIP da planta.
O verão é sazonalmente a época mais importante do ponto de vista de maior produção na indústria de bebidas, com exceção das fábricas que possuem apenas bebidas quentes. Este fator sazonal chega a comprometer o processo de higienização.
Existem três processos convencionais para o sistema CIP numa indústria de bebidas:
1) Processo três etapas (Pré-enxague, Solução de Detergente Alcalino ou Solução de Detergente Ácido e Enxágue Final) ou,
Processo 03 Etapas (Pré-enxágue, Sanitizante, Enxágue).
2) Processo 05 Etapas (Pré-enxague, Solução Detergente Alcalino ou Solução Detergente Ácido, Enxágue, Sanitizante e Enxágue).
3) Processo 07 Etapas (Pré-enxágue, Solução Detergente Alcalino, Enxágue, Solução Detergente Ácido, Enxágue, Sanitizante e Enxágue).
O terceiro processo seria o mais adequado, porém devemos considerar vários fatores de ordem operacional e PCP da Empresa, pois não podemos deixar de priorizar a produção, que atenderá ao departamento comercial do fabricante de bebidas. Ao mesmo tempo, às vezes a priorização da produção pode comprometer o fator qualidade do produto envasado. Por isso, o gerenciamento de produção tem que alinhar perfeitamente seus interesses dentro da unidade com os interesses do Departamento de Qualidade, e este trabalhará no conceito de viabilizar a melhor forma de atender às suas expectativas no que se refere à qualidade do produto final sem se degladiar com o setor de produção.
É difícil, pois uma das premissas do Departamento de Qualidade diz respeito ao fator higienização da planta, antes, durante e depois do processo produtivo. Alinhar este tempo, e atender a ambos os Departamentos é um gargalo frequente na Indústria de Bebidas. É aí que entra a trágica presença do fantasma invisível do BIOFILME.
Envase 1O setor ou as pessoas envolvidas com a limpeza terão que lidar com os principais mecanismos de deposição das sujidades, tais como:
• Deposição Mecânica: depósitos em poros e irregularidades das superfícies;
• Reação química induzida pelo calor: desnaturação de proteínas, Caramelização de açucares, Polimerização de gorduras, incrustação de sais inorgânicos;
• Biológicos: deposição e crescimento de microrganismos.
Uma irregularidade na forma de higienizar, ou um descuido que pode ser oriundo de um intervalo muito grande entre o final de um processo produtivo e início do processo de limpeza, pode causar um desencadeamento de colônias de microorganismos em algum local do sistema que está em contato com a bebida, e isso será o início de um iminente processo de formação do chamado Biofilme.
O Biofilme não está ligado apenas a uma irregularidade na forma de higienizar ou um descuido operacional, pode também estar condicionado a problemas de instalação do sistema da planta da empresa, tais como dimensionamento da bomba de envio da solução CIP, presença de pontos mortos no circuito, ausência de turbilhonamento na condução da solução CIP e também a problemas de escolha do produto adequado, pois o uso de matéria prima (Soda Cáustica, onde a mesma pode conter até 10.000 PPM de Cloretos, um veneno para o inox, causa pontos de corrosão localizada, chamada PITTING), e a característica da água utilizada para a diluição dos produtos CIP e Enxágues, onde a presença de Dureza (acima de 91 PPM em CaCO3) vai determinar, através da temperatura, a fixação de incrustações ao longo do circuito.
Obs.: Cerca de 50% de todos os problemas relacionados com CIP são devidos ao fluxo insuficiente. Na literatura sobre sistema CIP normalmente é indicado que a velocidade de um fluxo dentro das tubulações excedam 1,5 m/s para se alcançar bons resultados de limpeza, verificar Coeficiente de Reynolds, em que em sistemas com apenas escoamento interno, onde o fluido escoa em tubulações, o dimensionamento deve ser feito de modo a garantir um escoamento turbulento, ou seja, Re > 4000. Quanto maior for o fluxo turbulento, melhor a ação mecânica.
Isso minimiza muito a propensão a uma possível formação de BIOFILME durante a limpeza CIP.
EnvaseA prevenção de uma possível formação de camadas de colônias de microorganismos é fundamental numa planta de bebidas, utilizando-se dos processos adequados no momento da higienização do circuito, e a remoção torna-se, às vezes, um processo mais trabalhoso, pois vai demandar um tempo maior na remoção da mesma, e o uso de uma maior quantidade de Produtos Químicos, principalmente produtos Detergentes Ácidos, principal agente de remoção do BIOFILME, e também, um tratamento de choque no que diz respeito à SANITIZAÇÃO, onde o principal agente Sanitizante é o Ácido Peracético, acontecendo casos em que, como segurança, chega a utilizar numa concentração de aproximadamente 1500 PPM de PAA.
Importante: para a Passivação, o Detergente Ácido mais adequado é o que contém Ácido Nítrico, porém, para os processos de higienização diários, principalmente, para a eliminação de incrustações minerais e também para a eliminação das chamadas Pedra de Água, Pedra Cervejeira e Pedra de Leite, os Detergentes Ácidos à base de Ácido Fosfórico são ideais, mas isso não descarta o uso de qualquer um dos dois no processo de higienização diário.

Wellington Williams da Silva
Assessor Técnico de Bebidas da Mustang Pluron Química Ltda.

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