Tendência mundial,a saudabilidade inclui produtos orgânicos,
veganos e biodinâmicos.A busca por produtos saudáveis e sustentáveis
vem permeando todas as faixas da população brasileira
Carlos Donizete Parra
O mercado de produtos orgânicos, veganos e biodinâmicos continua em alta no Brasil. Esse é um movimento mundial que também encontra adeptos por aqui. Segundo pesquisa da Euromonitor, agência internacional de pesquisa de mercado, o Brasil já ocupa o 4o lugar em consumo de alimentos saudáveis no ranking global e movimenta R$ 35 bilhões por ano. O estudo revela que, nos últimos cinco anos, o crescimento do setor de alimentos e bebidas saudáveis foi, em média, de 12,3% ao ano.
O perfil do consumidor saudável é caracterizado pelo crescente aumento do consumo de orgânicos e de redução da ingestão de sal, açúcar, gordura e ingredientes artificiais. Especificamente sobre produtos orgânicos, a entidade setorial que promove esses produtos no Brasil, a Organis, divulgou recentemente estudo mostrando que a preocupação com a saúde é um dos principais motivos para a busca da população por produtos orgânicos, liderando o ranking com 84%, seguida por características do produto (30%), meio ambiente (9%), curiosidade (9%) e estilo de vida (7%). Ainda segundo a pesquisa, 53% dos entrevistados disseram estar ‘muito interessado’ e 35% ‘interessado’ em buscar informações sobre como manter uma alimentação mais saudável, esses dois itens juntos totalizam 88%, o que mostra que muitos brasileiros mudaram padrões de consumo de alimentos. A pesquisa revela números importantes para os rumos do setor, mostrando um caminho promissor já que 1 em cada 5 brasileiros (19%) consome algum produto orgânico (contra 15% de 2017). O número de vegetarianos no Brasil também saltou de 8%, em 2012, para 14%, em 2018, segundo pesquisa do IBGE citada pela SVB (Sociedade Vegetariana Brasileira), o que representa quase 30 milhões de pessoas.
A pesquisa Panorama do consumo de orgânicos no Brasil 2019 mostrou também que a grande maioria dos entrevistados (75%) acham caros os preços dos produtos orgânicos, mas acham justificado (48%) porque reconhecem o valor do processo e a saudabilidade. Desses, 47% acham difícil encontrar orgânicos em sua região, assim como acreditam que a diversidade de opções é limitada (52%). A conclusão é que é preciso investir em logística para garantir produto, pois a demanda existe. Cerca de 39% dos consumidores estão dispostos a consumir orgânicos nos próximos seis meses. Outro resultado importante verificado é que 19% dos entrevistados disseram consumir algum produto orgânico, sendo a região sul a que mais consome orgânicos (23%), seguida da região nordeste com 20%.
1 em cada 5 brasileiros (19%) consome algum produto orgânico (contra 15% de 2017)
“A pesquisa de 2019 mediu o consumo nos últimos 30 dias e dos últimos seis meses, chegando ao valor de 35% do share de compra de algum produto orgânico. A conclusão que tiramos é que independente de ser consumidor ou não, há o reconhecimento de valor no produto. A partir dessa pesquisa, podemos dizer com segurança que, na medida em que a renda do brasileiro aumentar, o tamanho do mercado de orgânicos também vai crescer, pois há motivação e disposição para o consumo”, conclui Cobi Cruz, diretor do Organis.
Esta preferência por produtos orgânicos vem fazendo com que o setor registre crescimento ininterrupto nos últimos anos – em 2018, o faturamento chegou a R$ 4 bilhões, 20% a mais que no ano anterior – e estima crescer na casa dos dois dígitos neste ano.
Em nível internacional, o Euromonitor aponta como tendências para os próximos anos a maior procura por produtos livres de glúten e lactose, fortificados, funcionais, probióticos e energéticos, o consumo consciente, o veganismo e o bem-estar animal em segmentos que vão além da alimentação, como moda e cosméticos.
Vinho orgânico
A comercialização de vinhos produzidos a partir de uvas orgânicas cresceu cerca de 20% nos últimos cinco anos e já representam 2,8% do mercado mundial, segundo levantamento da empresa de pesquisas britânica Wine Intelligence. No Brasil esse avanço foi de 60% nos últimos dois anos, conforme dados do Ibravin (Instituto Brasileiro do Vinho). O volume ainda é bem pequeno quando comparado ao total consumido no país, mas é um nicho a ser explorado pelas empresas do setor vinícola e que pode representar uma boa estratégia para agregar valor e expandir portfólio.
Nem todo vinho é vegano, nem todo vinho orgânico é vegano ou biodinâmico
A safra de 2019 no Estado do Rio Grande do Sul, que representa cerca de 90% da produção de vinhos no país, indica produção de 628,4 mil litros de suco de uva orgânico e 42,9 mil litros de vinho orgânico. As informações contidas no Sisdevin são autodeclaratórias, ou seja, de responsabilidade das vinícolas. Apesar do avanço significativo dos últimos anos, os 42,9 mil litros de vinho representam 0,03% dos 300 milhões de litros previstos para 2019.
“É o nicho, do nicho do nicho. Porém, quando se fala do microambiente de vinho, do restaurante de comida sustentável, do movimento orgânico, e dos grandes centros de consumo, é sim um movimento em voga”, afirma Rodrigo Lanari, proprietário da Winext, que representa a consultoria Wine Intelligence no Brasil.
O executivo explica que o próprio consumo geral de vinho no país ainda é baixo. “O Brasil é um mercado emergente e o consumo per capita é baixo, ao redor de 2 litros/ano por habitante. É verdade que se popularizou muito nos últimos dez anos com o ingresso de 9,8 milhões de novos consumidores regulares da bebida no período de 2010 a 2018; mas o consumo de vinho orgânico ainda está restrito a uma elite. O consumidor regular de vinho, cerca de 32 milhões de pessoas, ainda não tem entendimento do orgânico, a própria indústria do vinho não está sendo capaz de explicar o que é”, diz Lanari.
O aumento no consumo de produtos veganos, orgânicos e biodinâmicos é uma tendência verificada em nível mundial
Ele explica que outro diferencial está nos rótulos ecologicamente sustentáveis, que não necessariamente precisam ser orgânicos, estes, que dependem de certificação. “Para o consumidor o vinho já é um produto natural, já que é feito de uva. E isso precisa ser melhor explorado com os orgânicos. Nossas pesquisas indicam que o termo “sustentável” muitas vezes é melhor compreendido pelo consumidor”, afirmou.
Apesar de existirem definições variadas sobre vinhos orgânicos, o mais utilizado é que esses vinhos são produzidos a partir de uvas cultivadas sem o uso de pesticidas e outros materiais sintéticos, além de seguirem as regras e regulamentos de algum organismo de certificação orgânica sobre os métodos de vinificação. Os tipos de vinho orgânico também variam – os vinhos 100% orgânicos, os vinhos orgânicos (95% dos ingredientes são de fontes orgânicas certificadas, mas podem conter certo limite de aditivos) e os vinhos produzidos a partir de uvas orgânicas (70% das uvas são de origem orgânica certificada).
Segundo legislação específica, para que um produto seja considerado orgânico, o mesmo deve estar dentro de todos os princípios estabelecidos na Lei Federal 10.831 de 23 de dezembro de 2003. A identificação do produto orgânico é feita por meio do selo do Sistema Brasileiro de Avaliação Orgânica (SisOrg) do Ministério da Agricultura. No caso de agricultores familiares, que oferecem seus produtos para venda direta aos consumidores, a certificação orgânica é feita através do Cadastro Nacional de Produtores Orgânicos do Ministério da Agricultura (MAPA). As informações completas sobre regularização da produção orgânica podem ser encontradas no site do MAPA.
Além do orgânico
Quem está se fazendo entender nesse mercado de vinhos orgânicos é a Cooperativa Garibaldi, do Rio Grande do Sul. Formada predominantemente por cerca de 410 famílias produtoras de uvas, o foco principal é o da sustentabilidade. Desde 2001 a cooperativa tem um projeto para estímulo à produção orgânica entre os seus cooperados.
“O mercado brasileiro é tímido, porém vem crescendo de forma consistente e na casa de dois dígitos por ano. Primeiro estamos pensando na qualidade de vida do nosso produtor, e não distante disso temos um consumidor que quer hábitos de consumo mais saudáveis. A produção orgânica e biodinâmica vem de encontro com as crenças”, afirma Alexandre Angonezi,diretor executivo da Cooperativa Garibaldi.
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Segundo ele, dos cerca de 24 milhões de quilos de uvas produzidos pela cooperativa, 5% é de produção orgânica. Parte dessa produção deu origem ao primeiro lote de espumantes e sucos biodinâmicos certificados no país, o “Astral”. A agricultura biodinâmica é uma forma diferenciada de toda cadeia do cultivo que segue as mesmas normas da orgânica e inclui preceitos esotéricos que respeitam o equilíbrio entre a natureza, o homem e o universo.
Outra empresa gaúcha que vai trilhando esse caminho é a Vinícola Aurora. Um de seus produtos acaba de ser premiado na Wine South America, feira destinada aos produtores de sucos, vinhos e derivados da uva, realizada em Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul. O suco de uva integral Casa de Bento Orgânico, da Vinícola Aurora, foi o campeão do 1o Concurso dos Melhores Sucos de Uva, na categoria orgânico. A seleção dos melhores sucos de uva resultou de degustação às cegas de 52 amostras inscritas, realizada por 18 enólogos de diferentes entidades.
O suco de uva Casa de Bento Orgânico é 100% integral, natural, sem qualquer adição de açúcar, corantes, aromatizantes ou conservantes, assim como os demais sucos integrais da marca Casa de Bento.
Cerveja com sabor sustentável
Em meio a esse movimento de produtos naturais, orgânicos e veganos, um típico consumidor, amante da saúde e da natureza, apreciador de cerveja artesanal, decidiu desenvolver sua bebida, aquela que considerava ideal, para saborear na praia com seus amigos após as atividades esportivas. Foi assim que o ex-surfista profissional e paraquedista Marcos Sifú, criou a Praya, cerveja artesanal com ingredientes naturais e posicionamento sustentável, seguindo o estilo de vida de seu idealizador e de seus três sócios, companheiros de copo e de esportes na areia, que se juntaram ao empreendimento em 2016.
Em tão pouco tempo desde seu lançamento, a marca hoje está presente em 2 mil pontos de venda no país, nos estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Belo Horizonte e acaba de chegar em Brasília, projetando atingir 6 mil pdv’s até o final do ano. As vendas seguem em alta, com crescimento de 120% no primeiro semestre e expectativa de duplicar os resultados no próximo verão.
A produção é realizada de modo independente no Paraná. “Levamos a nossa produção para o estado e tivemos um ganho logístico devido à proximidade da fábrica com as praças da região Sul e Sudeste, mas pretendemos estar em todo o Brasil”, afirma Tunico Almeida, sócio.
Sabor sustentável – Ancorada nos valores da cultura de consumo de produtos saudáveis e da responsabilidade com os recursos naturais, a Praya tem encontrado receptividade crescente no consumo de suas cervejas. Recentemente lançada, a Praya Witbier, estilo de origem belga, produzida com trigo e temperada com raspas de limão siciliano, semente de coentro e com especiarias, tem origem 100% vegetal, ingredientes 100% naturais, totalmente livre de químicos.
“Para nós foi uma consequência natural pensar em algo que não fizesse mal à saúde, livre de ingredientes químicos, estabilizantes, aromatizantes sintéticos, e por aí afora”, afirma Paulo de Castro, um dos sócios. “É apenas o início de um tsunami global. Pessoas cada vez mais preocupadas com bem-estar, consumo consciente e sustentável; empresas se engajando cada vez mais. É só o começo. Não é à toa que o segmento de cervejas artesanais tem registrado crescimento exponencial no Brasil. É uma tendência de mercado.”
Entre as políticas responsáveis da Praya está a não participação em eventos que envolvam animais, dando prioridade aos esportivos e ao ar livre, patrocínio de atletas, além de buscar fornecedores com certificação de boas práticas socioambientais. “Também reduzimos o uso de rótulos e plástico em nossas embalagens e priorizamos copos biodegradáveis em nossos eventos e atividades internas”, diz Almeida. “Essa é a nossa Praya”.
A Praya acaba de receber o selo Eureciclo, concedido por uma plataforma capaz de rastrear e armazenar dados e que certifica empresas que destinam recursos para o desenvolvimento e operação das cooperativas de reciclagem. Assim, empresas como a Praya, que aderem ao movimento, pagam às cooperativas para retirarem do ambiente uma quantidade equivalente de material aos das embalagens de seus produtos. “É um importante passo para quem acredita que o negócio precisa ir além de lucrar”, ressalta o diretor de Comunicação da Praya, Paulo de Castro.
Para entender melhor
Vegano é quem pratica o veganismo, um estilo de vida que exclui totalmente o consumo de qualquer tipo de produto de origem animal.
O principal objetivo da pessoa vegana é promover a chamada “libertação animal”, que significa a exclusão do consumo de todos os tipos de animais, seja na alimentação, vestuário, entretenimento e outros. Por exemplo, os veganos não consomem produtos de empresas que fazem testes com animais ou que mantêm funcionários em regime análogo ao da escravidão. Os veganos não compram animais de estimação (adotam), não usam roupas feitas a partir de animais (lãs, peles, couros, sedas) e não frequentam locais onde os animais são usados para o entretenimento (circos, touradas, rodeios).
Qualquer tipo de produto que seja de origem animal está excluído da dieta vegana, como peixes, carnes, aves, crustáceos, leite, ovos, mel.
Os veganos podem comer qualquer tipo de alimento de origem vegetal, como cereais, frutas, legumes, tubérculos, verduras, raízes, cogumelos, entre outros.
O vegetariano, por sua vez, costuma limitar apenas a sua alimentação, seja por questões éticas ou de saúde. Mas, ao contrário dos veganos, os vegetarianos consomem produtos que sejam de origem animal, como roupas de lã ou sapatos de couro, por exemplo.
Os vegetarianos também costumam comer alimentos com derivados de animais, como leite, mel e ovos, mas não consomem a carne em si, como aves, peixes e crustáceos.
Existem diferentes níveis e tipos de vegetarianismo:
• Ovolactovegetariano: não come carnes, mas consome alimentos de origem animal (leite, ovos e mel, por exemplo).
• Lactovegetariano: não come carnes e ovos, incluindo produtos que usam ovos como ingrediente.
• Vegetariano estrito: não comem nada que seja de origem animal.