Aspectos regulatórios e legislação tributária podem responder
pelo sucesso no lançamento e ciclo de vida do produto,
assim como pelos resultados financeiros
Por Carlos Donizete Parra
Os consumidores buscam a cada dia bebidas com características diferenciadas que possam atender suas necessidades e desejos que mudam de acordo com o público e seus comportamentos. Isso requer mais agilidade das indústrias e profissionais que precisam responder a essa demanda de personalização. Um dos desafios que dificultam os lançamentos de produtos no Brasil são os aspectos regulatórios. Por isso, é importante logo no início do desenvolvimento verificar a regulamentação da nova bebida. Pode acontecer, por exemplo, que as empresas confundam uma bebida com adição de vitaminas (que pode ser funcional) com um simples refresco enriquecido.
Caso específico são os refrigerantes prebióticos, que podem ser incluídos na lista de bebidas funcionais, uma categoria totalmente distinta da categoria de refrigerantes e, por isso, sujeitas a diferentes regulamentações e legislações.
1. Refrigerantes
Definição legal:
Segundo a Instrução Normativa nº 41/2019 da ANVISA, refrigerante é a bebida não alcoólica e não fermentada, com características próprias de sabor e aroma, elaborada com água potável e ingredientes como extratos vegetais, sucos ou aromas.
Legislação principal:
• Resolução CNNPA nº 12/78
• IN nº 41/2019 (Padrões de identidade e qualidade para refrigerantes)
• RDC nº 259/2002 e RDC nº 360/2003 (rotulagem nutricional)
• Lei nº 8.918/1994 (Regula a produção de bebidas no Brasil)
Registro:
Dispensado de registro na ANVISA, mas sujeito à fiscalização.
Requisitos:
• Teores máximos de aditivos como corantes, conservantes e edulcorantes.
• Obrigatoriedade de seguir padrões de qualidade microbiológica.
• Restrições quanto à alegação de propriedades funcionais ou terapêuticas.
2. Bebidas Funcionais
Definição legal:
São bebidas adicionadas de ingredientes com propriedades funcionais ou de saúde, como probióticos, vitaminas, minerais, fibras, extratos vegetais, entre outros.
Legislação principal:
• RDC nº 27/2010 (Obrigatoriedade de registro de alimentos com alegações funcionais ou de saúde)
• RDC nº 54/2012 (Alegações de propriedade funcional e de saúde)
• RDC nº 243/2018 (Suplementos alimentares – em alguns casos)
• IN nº 28/2018 (Lista de constituintes autorizados para suplementos)
Registro:
Obrigatório o registro na ANVISA, se houver alegações de propriedades funcionais ou de saúde.
Requisitos:
• Provas científicas para alegações funcionais.
• Limites seguros de uso de ingredientes ativos.
• Informações específicas obrigatórias no rótulo, incluindo advertências.
• Estão sujeitas a avaliação toxicológica e de eficácia.
O refrigerante prebiótico, geralmente, é considerado uma bebida funcional, desde que atenda a certos critérios:
Definição de prebióticos:
Prebióticos são ingredientes alimentares (normalmente fibras como inulina, FOS, GOS, entre outros) que estimulam o crescimento ou atividade de microrganismos benéficos no intestino, promovendo benefícios à saúde.
Bebida Funcional:
Segundo a ANVISA, uma bebida funcional é qualquer alimento que, além das funções nutricionais básicas, produz efeitos metabólicos ou fisiológicos benéficos à saúde, podendo prevenir doenças ou contribuir para sua redução de risco.
Se o refrigerante contém prebióticos em quantidades eficazes, e se o fabricante deseja alegar benefícios funcionais (como “auxilia no equilíbrio da flora intestinal”), ele se enquadra como alimento com alegação funcional.
Requisitos legais para ser considerado funcional:
1. Registro obrigatório na ANVISA
• Segundo a RDC nº 27/2010, alimentos com alegações funcionais devem ser registrados.
2. Comprovação científica dos efeitos alegados
• Exigida pela RDC nº 54/2012.
• O fabricante deve apresentar estudos que comprovem o benefício funcional do prebiótico na dose usada.
3. Uso de substâncias autorizadas
• A ANVISA possui uma lista positiva de ingredientes com alegações funcionais reconhecidas.
• Exemplo: inulina e frutooligossacarídeos (FOS) são aprovados para alegação de “contribuição para o funcio
namento intestinal”.
4. Rotulagem específica
• Precisa conter a alegação aprovada, a dose diária recomendada, e advertências, se aplicável.
• Não pode alegar “cura” ou “tratamento” de doenças.
Se o refrigerante contiver prebióticos mas não fizer nenhuma alegação funcional ou de saúde no rótulo, ele pode não precisar de registro, dependendo da formulação. Porém, ainda estará sujeito à fiscalização quanto ao uso de aditivos e segurança alimentar.
Regime tributário
O regime tributário para bebidas funcionais e refrigerantes comuns no Brasil pode ter diferenças significativas, dependendo da classificação fiscal do produto (NCM) e da forma como ele é declarado junto à Receita Federal e aos órgãos estaduais.
1. Classificação Fiscal (NCM)
A Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM) define a base para aplicação de impostos como:
• IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados)
• ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços)
• PIS/COFINS (contribuições sociais federais)
Refrigerantes:
• Normalmente classificados na posição NCM 2202.10.00:
“Águas, incluídas as minerais e as gaseificadas, com adição de açúcar ou outro edulcorante ou aromatizante”.
Tributação:
IPI: geralmente de 4% a 30%, dependendo do tipo.
ICMS: varia por estado, mas pode chegar a 25%.
PIS/COFINS: regime monofásico — recolhido por quem fabrica ou importa.
Bebidas funcionais:
• A depender da composição, podem ter NCMs como:
• 2202.99.00 (outras bebidas não alcoólicas)
• 2106.90.90 (outras preparações alimentícias) — comum em bebidas com ativos como
probióticos, vitaminas, etc.
• Tributação:
• IPI: pode ser isento ou ter alíquota reduzida, dependendo do NCM.
• PIS/COFINS: pode ser cumulativo ou não cumulativo, e às vezes não é monofásico.
• ICMS: varia de acordo com o estado e pode ter isenções específicas para produtos considerados
“saudáveis”.
2. Regime Tributário da Empresa
A tributação também muda com base no regime da empresa:
Dica prática
• A escolha do NCM correto é fundamental. Erros podem gerar autuações fiscais.
• Um refrigerante com prebiótico pode ter tratamento tributário mais favorável se for corretamente classificado como bebida funcional.
• O enquadramento fiscal também afeta o preço final ao consumidor e a competitividade do produto. O enquadramento depende principalmente de dois fatores:
1. Composição e ingredientes usados
2. Alegações feitas no rótulo
Contudo, é possível seguir diretrizes técnicas e regulatórias para que a fórmula seja aceita como um produto seguro, funcional e legalmente definido.
Diretrizes para formular um “refrigerante prebiótico”
Base da bebida (características de refrigerante):
• Água potável, com ou sem gás
• Aromatizantes naturais ou extratos vegetais
• Edulcorantes ou açúcares (em limites permitidos)
• Corantes e conservantes autorizados pela ANVISA
• pH geralmente entre 2,5 e 4,5
Isso o mantém como um produto com “características de refrigerante”, segundo a IN nº 41/2019.
Ingredientes funcionais (prebióticos)
Para alegar funcionalidade, a quantidade presente na dose diária do produto deve ser comprovadamente eficaz, conforme estudos científicos.
Outros ingredientes possíveis:
• Vitaminas (como C, D, B12), minerais (como zinco ou magnésio)
• Ácidos orgânicos (como cítrico, málico)
• Antioxidantes naturais (chá verde, cúrcuma, etc.)
Exemplo básico de fórmula conceitual:Nome do produto: Bebida com gás sabor limão com inulina
Ingredientes:
• Água gaseificada
• Aromatizante natural de limão
• Edulcorante natural (stevia ou eritritol)
• Inulina (3 g por porção de 300 ml)
• Ácido cítrico (acidulante)
• Benzoato de sódio (conservante – opcional)
• Vitamina C (ácido ascórbico – antioxidante)
Regulamentação Anvisa RDC 54/2012 RDC 54/2012 Exige comprovação Autorizada Detalhes Alegação (se registrada): “Contém inulina – fibra prebiótica que contribui para o equilíbrio da flora intestinal.”
Alegação
“Contém inulina – fibra prebiótica que contribui para o equilíbrio da flora intestinal.”
Conclusão
Você não precisa seguir uma fórmula única, mas deve:
• Manter características de refrigerante (para o apelo ao consumidor)
• Incluir quantidades eficazes de prebióticos (para a função)
• Evitar ingredientes proibidos
• Escolher corretamente o NCM para evitar tributação excessiva
• Fazer o registro na ANVISA se quiser alegar função prebiótica
Via de regra no Brasil, o tempo total para registrar e lançar um refrigerante prebiótico no mercado pode variar bastante, dependendo de diversos fatores regulatórios e operacionais. Para isso, segue um panorama geral, dividido por etapas:
Etapas e prazos estimados
1. Desenvolvimento da fórmula e testes laboratoriais
• Tempo: 1 a 3 meses
• Inclui:
Pesquisa e desenvolvimento da fórmula
Testes de estabilidade, segurança, sabor, validade
Adequação a limites legais de ingredientes
2. Dossiê técnico e preparação para registro na Anvisa
• Tempo: 1 a 2 meses
• Documentos exigidos:
Composição completa
Evidência científica dos prebióticos usados
Estudos que comprovem alegações funcionais
Laudos técnicos
Relatórios toxicológicos (se aplicável)
3. Registro na ANVISA (se houver alegações funcionais)
Tempo: 3 a 12 meses, dependendo do tipo de alegação
Importante: Produtos sem alegações funcionais e classificados apenas como alimentos não precisam de registro, apenas comunicação prévia e cumprimento das normas.
4. Registro no MAPA (caso haja suco, extratos vegetais ou produtos de origem vegetal animal)
Tempo: 1 a 2 meses (se necessário)
5. Rotulagem, embalagem e adequação de marketing
• Tempo: 1 mês
• Rótulo deve seguir:
RDC nº 429/2020 (rotulagem nutricional)
RDC nº 54/2012 (alegações funcionais)
IN nº 75/2020 (design nutricional frontal, se aplicável)
6. Produção piloto + escala industrial + distribuição
• Tempo: 2 a 4 meses
• Inclui ajustes na linha de produção, fornecedores, logística e canais de venda.
Tempo total estimado:
• Produto com alegações funcionais:
9 a 18 meses, desde a formulação até o lançamento no mercado.
• Produto sem alegações funcionais (só com prebiótico):
4 a 8 meses, com processo simplificado e sem registro na ANVISA.
Acelerando o processo
1. Use alegações já aprovadas pela ANVISA (evita análise mais longa).
2. Contrate uma consultoria regulatória especializada em alimentos funcionais.
3. Planeje o lançamento com etapas paralelas (ex: marketing e rótulo enquanto aguarda ANVISA).
4. Utilize ingredientes da “lista positiva” (evita necessidade de estudos adicionais
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