A substituição de parte do açúcar por edulcorantes
pode ser uma oportunidade de negócios para as indústrias
de bebidas não alcoólicas, mas também pode ser um tiro
no pé para aqueles que não fizerem as trocas adequadamente
por CARLOS DONIZETE PARRA
A liberação da mistura de açúcar e edulcorantes na composição de refrigerantes, refrescos e outras bebidas não alcoólicas deverá aumentar as opções desses produtos ao consumidor. Os fabricantes já iniciaram o lançamento de novos produtos de acordo com os padrões estabelecidos pela nova medida que foi publicada no dia 17 de dezembro de 2015 no Diário Oficial da União, Decreto 8.592 da Presidência da República.
A nova medida desponta como uma oportunidade para geração de negócios com o incremento de novos consumidores preocupados com as questões relacionadas à saúde e qualidade de vida. Para o refrigerante, bebida não alcoólica mais consumida pelos brasileiros, apresentar um produto “mais saudável” é uma chance de dar uma virada no jogo e reverter a curva de queda nas vendas registrada nos últimos anos. O refrigerante é a segunda bebida não alcoólica mais consumida no mundo ficando atrás apenas da água engarrafada. No Brasil, a produção de refrigerante vem apresentando quedas consecutivas, mas mesmo assim em 2015 as vendas chegaram a 14,9 bilhões de litros, segundo dados do Sicobe da Receita Federal. O consumo per capita também caiu passando de 80,6 litros em 2014 para 75,1 litros por pessoa em 2015.
Igor Castro, diretor técnico da ABIR
(Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes)
Apesar da redução no consumo, os volumes são bastante expressivos, principalmente quando comparados com outras bebidas não alcoólicas como sucos, néctares e chás. Por isso é um setor importante que recebe atenção das indústrias de bebidas e de seus fornecedores.
A legislação que começou a vigorar em dezembro passado permite uma redução de, pelo menos, 25 % do açúcar do refrigerante regular e permite às indústrias de bebidas conquistar uma fatia importante de consumidores preocupados em não ingerir mais açúcar. “A atenção ao consumo de açúcar vem ganhando cada vez mais espaço no campo da alimentação. Recentemente, a OMS publicou que o brasileiro consome 50% acima da quantidade recomendada diariamente do ingrediente. Além disso, os índices de obesidade e diabetes contribuem para tornar esse ponto ainda mais alarmante”, explica Marco Paulo Pereira Henriques, gerente de marketing da Duas Rodas.
Luciano Koller, BU Head-Flavors,
Collours and Health Nutrition da Döhler
Abre-se também uma oportunidade à indústria para uma nova categoria de consumidores que preocupam-se com a saúde, mas não estão dispostos a abrir mão do sabor de um produto regular.
É importante lembrar que a utilização da mistura de açúcar com edulcorantes no Brasil já era permitida pela Anvisa, para alguns produtos, sendo comum em diversos alimentos como iogurtes, gelatinas etc. No caso das bebidas não alcoólicas, a mistura de açúcar e edulcorantes já é praticada há muitos anos em diversos países do mundo, inclusive naqueles onde há rigoroso controle sobre os alimentos, como os Estados Unidos e a Europa. “Sua regulamentação no Brasil ocorreu somente em dezembro de 2015, através da publicação do Decreto 8.592 da Presidência da República. As bebidas serão facilmente identificadas das demais, pois no painel principal do rótulo teremos uma frase referente aos atributos “baixo em açúcares” ou “reduzido em açúcares”, em conformidade com a legislação da Anvisa RDC 54/2012. Antes desse Decreto, era possível consumir somente bebidas com 100% de açúcar ou então com 100% de edulcorantes, que são as bebidas denominadas de “diet”, “light” ou “de baixa caloria”. A liberação do uso da mistura de açúcar e adoçantes disponibilizou para a população brasileira mais uma opção de consumo, menos calórica em relação às bebidas regulares (100% açúcar) e com sabor diferenciado em relação às bebidas sem açúcar. Pela legislação vigente para alimentos e bebidas com informação nutricional complementar, a RDC 54/2012 da Anvisa, define em seu item 5.2 sobre “conteúdo comparativo” que deve-se substituir no mínimo 25% do açúcar do refrigerante regular sendo que, adicionalmente, a redução deve ser de pelo menos 5 gramas de açúcar por 100 ml da bebida”, explica Igor Castro, diretor técnico da Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes.
A quantidade máxima de cada edulcorante no produto final depende da “Ingestão Diária Aceitável (IDA)”, entendida como o nível seguro de consumo para cada aditivo. O Aspartame, por exemplo, tem IDA definida em 40 mg/kg de massa corpórea por dia.
Benefícios
Os ganhos com a nova portaria se estendem tanto para consumidores quanto para a indústria. Para as indústrias, a diminuição do consumo de açúcar implica em menores custos de transporte, armazenagem e manipulação no processo industrial. “Outro benefício é que o poder dulçor dos edulcorantes (30 a 8000 x a força do açúcar) mais as soluções tecnológicas desenvolvidas para suportar o melhor “mouthfeel” na aplicação em bebidas e alimentos, proporcionam, hoje em dia, a indulgência sem culpa. Entre estas tecnologias podemos citar os “Sugar Replacers”, “Body Systems” e “Flavour Maskings”. Todas estas tecnologias de aromatização auxiliam o dia a dia das indústrias”, declara Luciano Koller, BU Head – Flavors, Collours and Health Nutrition da Döhler.
Para os consumidores, o principal ganho está na redução de calorias e da ingestão de açúcar. O consumidor ganha mais opções de bebidas e melhor qualidade de vida.
A Vogler Ingredients é outra empresa do setor com grande know-how no desenvolvimento de soluções para redução e substituição de açúcar em bebidas. “Temos mais de 26 anos de expertise no mercado alimentício e o setor de bebidas sempre foi um de nossos pilares de sucesso. Nesse caso específico acredito que o maior ganho para o consumidor é a diminuição de calorias nos produtos, sem perder o apelo de indulgência. Trabalhamos sempre com essa preocupação, afinal de contas, o mundo ideal é termos produtos mais gostosos e mais saudáveis”, garante Régis P. Inácio, gerente de marketing da Vogler Ingredients.
Soluções saudáveis
Marco Paulo Pereira Henriques,
gerente de marketing Duas Rodas
Os edulcorantes que serão utilizados em substituição parcial ao açúcar já existem e são empregados na produção de bebidas há muito tempo, o que se busca a todo momento são soluções atrativas aos consumidores e ao mesmo tempo que possam ser de fácil aplicação para indústrias de bebidas e alimentos. ‘Os edulcorantes de alta intensidade, realmente, já fazem parte do dia a dia das empresas, porém, a demanda por soluções saudáveis, naturais e “clean label” levou as empresas a buscarem soluções naturais de adoçamento através de outras fontes, como sucos concentrados, por exemplo, e a frutose, monossacarídeo naturalmente presente nas frutas. Esta mesma tendência levou as empresas de ingredientes a desenvolverem sistemas de adoçamentos que permitem a substituição parcial do açúcar (25% a 60%) através de matérias-primas que podem ser consideradas “aromas”. Estes desenvolvimentos inauguraram uma nova era na indústria de alimentos e bebidas na década de 90 com os chamados “Sweeteners Enhancers”, sendo muito bem aceitos pela indústria para reduções parciais de açúcar”, garante Luciano Koller.
Koller explica que a Döhler desenvolveu soluções naturais de adoçamento com base nos resultados de pesquisas sobre novas matérias-primas e frações naturais do próprio açúcar de cana. “Dessa forma, nossas tecnologias de redução de açúcar MultiSense®, MultiSweet Fruit®, MultiSweet Stevia® e MultiSweet Classic® entregam as soluções sob medida para cada cliente e adequadas para cada produto final, seja bebida ou alimento, sem comprometer as características sensoriais e organolépticas do produto, uma vez que utiliza tecnologias de “masking & body agents” proporcionando ao consumidor experiências multissensoriais com produtos mais saudáveis, nutritivos e saborosos”, diz o executivo da Döhler.
A substituição do açúcar pode ser feita de maneira simples trocando o produto pelo edulcorante, mas há o risco de residuais de sabores que podem ser rejeitados pelo consumidor. “Isso abre a oportunidade para o desenvolvimento de blends e moduladores de sabor que criam sinergia e mascaram estas notas. A Duas Rodas lançou, no início deste ano, a linha S-FIT inicialmente para refrigerantes. Todos os itens permitem a substituição de até 50% de açúcar das formulações sem deixar residual, a questão mais importante para o consumidor. Além disso, a linha também contribui para uma economia entre 25% e 50% para as empresas fabricantes de bebidas, garante ao produtor a redução de custos de produção, uma vez que o açúcar é parte considerável dos custos e seu valor sofre com oscilações tanto do dólar quanto da demanda por etanol, como também padronização de sabor e dulçor, redução da estocagem de açúcar, entre outros. No mercado de refrigerantes, a entrega de sabor é fundamental”, explica Marco Paulo Pereira Henriques, executivo da empresa.
Flávio Moribe, diretor comercial da Tovani Benzaquen
A Tovani Benzaquen, empresa com amplo conhecimento na área de ingredientes para bebidas, também desenvolveu um conjunto de opções e sistemas de edulcorantes customizados para cada tipo de bebida levando em consideração sabor e custo, sempre se preocupando com a qualidade e segurança dos fabricantes de cada edulcorante e sua procedência.
‘Estas soluções oferecem como principais vantagens a redução de custo com a manutenção do sabor; uma opção competitiva de excelente sabor pela alternativa natural; a não utilização de edulcorantes com contra indicações e tarjas de advertências; além de sistemas de adoçamento sem inclusão de sódio”, recomenda Flávio Moribe, diretor comercial da empresa.
Qualidade sensorial
A utilização de edulcorantes, de uma maneira geral, pode resultar em produtos com sabores residuais não agradáveis e aí é que entra um bom trabalho de desenvolvimento do ingrediente certo de acordo com as necessidades de cada indústria e de cada projeto específico. Segundo Flávio Moribe, da Tovani Benzaquen, os edulcorantes de boa qualidade já permitem a manutenção total da qualidade da bebida final mesmo em reduções bem maiores que o mínimo de 25% que a legislação exige.” Quanto mais próximo ao sabor do açúcar, maiores são as chances do projeto dar certo e se manter no mercado. E essas novas tecnologias em sistemas de adoçamento, utilizando edulcorantes permitem essa qualidade sensorial”, garante Flávio Moribe.
Régis P. Inácio, gerente de marketing da Vogler
Com uma grande variedade de soluções em seu portfólio, a Vogler busca sempre entender a necessidade do cliente e a partir daí desenhar soluções específicas para cada tipo de negócio, dando uma identidade própria para o produto. “ Uma dessas soluções é o desenvolvimento de blends de edulcorantes naturais, tendo a stevia como a grande estrela. A stevia é um edulcorante nativo da América do Sul e, atualmente, com as tecnologias empregadas é possível apresentar esta opção com perfis sensoriais bem agradáveis”, explica Régis Inácio, da Vogler.
Qualidade x Custos
É possível que algumas indústrias queiram aproveitar o lançamento de alguma bebida e utilizar produtos e soluções que privilegiem somente as questões de custo, mas essa estratégia não é nenhum pouco inteligente já que o consumidor brasileiro encara qualidade como um quesito básico e não como um diferencial. “Temos um público mais exigente e, que ainda mais com a crise, esforça-se para manter sua cesta intacta. Portanto, lançamentos ou alteração de fórmula visando apenas a redução de custo não significa continuidade no mercado, e a isso é o consumidor que está dando a resposta”, acredita Marco Paulo Henriques, da Duas Rodas.
Luciano Koller chama a atenção das indústrias também para a utilização das soluções e tecnologias adequadas a fim de evitar problemas de aceitação da bebida no mercado.”Basta um passo em falso para que a marca tenha dificuldades no mercado. Utilizando-se de tecnologias adequadas é possível conciliar redução de açúcar, qualidade de produto e aceitação pelo consumidor, resultando em produtos vencedores no mercado”, finaliza o executivo da Dohler.