Cada vez mais exigentes,
os consumidores não querem só comer ou beber, eles querem uma experiência completa. Entenda como a indústria
de bebidas tem usado o olfato como estratégia para conquistar ‘fãs’
a partir do aroma
Por Thais Martins
O olfato é um dos sentidos mais poderosos do ser humano. A partir de um cheiro, lembranças são revisitadas, desejos são despertados e até a vontade de experimentar é aguçada, ligando diretamente o olfato ao paladar.
Contudo, para toda essa teia de sentidos e sensações, há uma explicação biológica. Um simples perfume pode provocar uma reação emocional antes mesmo do nosso cérebro processar a fragrância captada.
Isso acontece porque o córtex olfativo tem uma ligação direta com o hipocampo, uma pequena formação cerebral que desempenha um papel importante no sistema límbico, responsável pelas nossas memórias e emoções. Logo, quando ativado por um estímulo externo, que é o aroma, o cérebro desencadeia uma reação neurológica na memória, associando tal cheiro a fatos importantes da nossa vida.
Através de diversos estudos sobre o poder do olfato e as reações que ele proporciona, as indústrias alimentícias e de bebidas tem percebido que a fragrância certa pode despertar sensações que quando ativadas permitem que o consumidor associe lembranças positivas a sua marca e seu produto instantaneamente.

“Comecei na indústria de bebidas com uma obsessão que me acompanha desde criança, a obsessão pelo aroma”, Haroldo Narciso, Master Blender da Famigerada Cachaça
Memória olfativa e o desejo de provar
Quando falamos nos sentidos humanos, estamos nos referindo a algo muito instintivo e natural. É como se o cheiro fosse um caminho de volta para casa, para o aconchego da família, para o abraço dos amigos e de quem amamos. Haroldo Narciso, Master Blender da Famigerada Cachaça, referência nacional em cachaças artesanais, contou à revista Engarrafador Moderno que foi ainda criança, num tradicional almoço de domingo, que ele percebeu o poder do aroma.
“Comecei na indústria de bebidas com uma obsessão que me acompanha desde criança, a obsessão pelo aroma. Lembro quando minha mãe me passou uma cachaça para cheirar. Ali entendi a conexão do aroma com o sabor. Foi observando a minha mãe que não bebia, mas que cheirava, que acendeu essa chave de que se pode proporcionar para uma pessoa satisfação e alegria simplesmente pelo aroma da bebida. Então hoje quando desenvolvo uma bebida me preocupo muito, por exemplo, se o álcool não vai se sobressair”, conta Narciso. E enfatiza, “convencendo o degustador no aroma, é muito provável que ele beba”.
Nos bastidores: a escolha do aroma perfeito
De acordo com Régis P. Inácio, Gerente de Marketing da Vogler, o aroma é a identidade e personalidade do produto, e deve estar alinhado com a identidade da empresa e principalmente com o seu público-alvo.
“Falar sobre aromas é desafiador, você pode seguir o caminho em acompanhar o mercado ou ser disruptivo. Uma boa estratégia, são produtos com edições limitadas para testar o seu consumidor”. Para tanto, Inácio ressalta a importância dos aromistas no processo de criação e desenvolvimento dos produtos na indústria de bebidas. “São profissionais fantásticos, pois tem uma sensibilidade incrível em detectar notas que são imperceptíveis para a grande maioria, porém no final faz muita diferença”.
Diferença que vai muito além do produto pronto. Um processo que não pede pressa, mas estudos e testes. E por falar em pesquisas, segundo o Gerente de Marketing da Vogler, a tendência atual é ser o mais natural possível. “O caminho no futuro passa por naturalidade junto com sustentabilidade. Precisamos saber a procedência, ter cuidado social etc.”.

As indústrias de bebidas sabem que a fragrância certa pode despertar sensações que quando ativadas permitem que o consumidor associe lembranças positivas a sua marca e seu produto
Uma reflexão que está diretamente ligada ao jeito Famigerada Cachaça de produzir. “Quando desenvolvo uma bebida me preocupo muito se o álcool não vai se sobressair porque em cachaça o aroma do álcool geralmente ‘grita’, mas isso não acontece com a minha bebida, mesmo pura. Levo muito em conta a variedade da cana que estou utilizando, o trabalho feito na fermentação que acho muito importante. Nós usamos leveduras do próprio ambiente onde é plantada a cana, com o caldo da própria cana, e a nossa destilação também não é só por medição. Ela acontece também pelo aroma”, ressalta Haroldo.
O cheiro que o seu público procura
Com o objetivo de atender um público mais jovem, dinâmico e ousado, a Harvus Energy Drink mergulhou no mundo dos aromas à procura do cheiro perfeito para suas bebidas. “Nós buscamos aromas com uma pegada moderna, jovem, dinâmica, refrescante, diferente, original e que mais tivesse a nossa cara! Queríamos algo superior ao que encontramos no mercado, que se enquadra na categoria de produto premium”, ressalta a Diretora de Projetos e Desenvolvimento, Paula Scalabrini.
Como o objetivo da Harvus é atender bem os seus consumidores, ninguém melhor que eles, para dizer o que desejam consumir, quais sabores, quais perfis. “Utilizamos a experiência multissensorial da ingestão de alimentos e bebidas, que envolve todos os sentidos com diferentes vias para o cérebro; desde o processamento da visão, da audição e do tato do alimento e bebida até o cheiro mais proximal, o sabor e o processamento táctil (mouthfeel). No mundo dos aromas podemos considerar diversas possibilidades de ingredientes, no nosso caso, por exemplo, utilizamos compostos aromáticos, extratos, óleos essenciais, entre outros. Os aromas trouxeram uma identidade única às nossas bebidas, são aromas que realmente caracterizam as nossas bebidas, e que deixam aquele gostinho de quero mais na boca”, diz Scalabrini.

“Um ponto importante a considerar é o aspecto regulatório. Temos um grande número de legislações vigentes que impossibilitam adições de ingredientes inovadores na formulação, inviabilizando os lançamentos “, Mariana Ivanoff, Tovani Benzaquen Ingredientes
O Brasil diante do mundo
Na percepção de Mariana Ivanoff, Gerente Comercial de Aromas da Tovani Benzaquen Ingredientes, as inovações em bebidas no mercado brasileiro ainda parecem ser orientadas pelos lançamentos em outros países. “Acabamos nos comportando mais como inovações incrementais do que disruptivas. É comum ver lançamentos de variações de sabores de uma mesma categoria, mas pouco se vê novidades em novas categorias. Um ponto importante a ser considerado no ramo da inovação é o aspecto regulatório. Temos um grande número de legislações vigentes, que impossibilitam adições de ingredientes inovadores na formulação, inviabilizam lançamento por enquadrar o produto em uma categoria de alta tributação, onerando o custo”.
Segundo Mariana, o mercado de aromas é bastante globalizado. “Hoje estão presentes no Brasil as principais multinacionais do setor, fazendo com que estejamos no mesmo patamar que países de primeiro mundo. Essas indústrias trouxeram suas tecnologias para cá há algumas décadas e começaram a produzir localmente, diminuindo a dependência de importação e agregando escala aos perfis mais demandados pelos brasileiros”, finaliza.
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