Concorrência desleal no mercado de cervejas? Isso existe?

Práticas abusivas de preços prejudicam a livre concorrência e podem ser
devastadoras para o mercado de cerveja artesanais

HENRIQUE OLIVEIRA

Há décadas se ouve sobre histórias de práticas de mercado escusas realizadas por grandes cervejarias de forma a promover a concorrência desleal no segmento de cervejas, no Brasil.

Em algumas pesquisas que realizei para um novo livro que estou escrevendo, vi diversos periódicos e documentos que tratavam o tema “abuso da concorrência”, danificando mercados locais.

Na década de 1960, Teodomiro Braga, Hermógenes Ladeira e outros pequenos produtores denunciavam ao SNI (Serviço Nacional de Informações) e ao CADE os atos das grandes cervejarias sobre vendas casadas. O mesmo ocorreu na década de 1990 quando da união da Antárctica com a Brahma.

Recentemente, um amigo do segmento comentou no Facebook sobre a atual prática de venda de cervejas por parte da Ambev, que está colocando no mercado cervejas especiais e importadas com “50% de desconto” ou ainda “pague 1 leve 2”. (Não se tratava de cervejas com vencimento próximo).

Ao seu ver, (pelo menos foi o que entendi) a prática da Ambev se trata de algo normal, e para tanto ele ilustrou o seu ponto de vista por meio de um pequeno documentário chamado de “Como os lobos mudam rios”. (https://www.youtube.com/watch? v=nW5ztScNCYk).

O referido documentário retrata que sem um predador (no caso o lobo) em um ambiente habitado unicamente por herbívoros haveria um desiquilíbrio do ecossistema local e dessa forma o suprimento vegetal seria prejudicado e outros habitantes e o meio sofreriam com isso, inclusive os rios. Dessa forma predados, (herbívoros) deveriam se adaptar às ações do predador se direcionando para outros cantos e agindo de outras formas em busca da sobrevivência, ou seja, uma questão de adaptação ao ambiente com a presença do predador. A analogia foi até legal e interessante só que acredito que o predador do ecossistema em análise (mercado de cervejas) não se trata de um lobo e sim de um caçador…e dos bem armados.

Alguns cervejeiros mencionam que a prática ambeviana é considerada como um ato de “dumping”. Ledo engano. Dumping é uma discussão comercial a ser realizada e discutida entre países e não entre empresas na OMC (Organização Mundial do Comércio), que questionam práticas abusivas que prejudicam mercados entre si. Portanto, não se trata de dumping.

O que vem ocorrendo atualmente é, talvez, prática lesiva à livre concorrência. É vender abaixo das margens razoáveis de lucro para prejudicar um mercado. Vou explicar melhor: consultando um site simples de vendas de cervejas da marca “Goose Island” nos Estados Unidos (http://www.wine-searcher.com/find/goose+ island+india+pale+alebeer+illinois +usa) a cerveja longneck de 355 ml é vendida em média a R$ 6,36. Como vendê-la no Brasil após a conversão da taxa de câmbio, pagamento dos impostos de importação, ICMS, IPI, PIS, COFINS, dos gastos com logística, do lucro da Ambev e o lucro do distribuidor a R$ 7,45, ou seja, a R$1,09 de margem bruta? Aí está o “X” da questão. O importparity, (importparity é a comparação que se faz entre o preço de venda nacional do produto no cliente final comparado com o preço de venda de um produto importado que foi nacionalizado de igual teor) é discrepante. (O preço de uma longneck é em torno de R$ 16,00). Não há produtor que consiga tirar lucro sustentável com tal margem. É dar produto ao mercado para prejudicar o direito da livre concorrência. É destruição de valor. É destruição de mercado.

Pelo atual cenário, parece que importar cerveja dos Estados Unidos seria o máximo e todos deveriam fazer o mesmo, pois produzir cerveja no país pelo custo Brasil não valeria a pena. Seria isso mesmo? Ou ainda: o preço da longneck de uma IPA do microcervejeiro nacional estaria demasiadamente caro porque os microprodutores gostam de cobrar caro e o governo adora isso, pois cobram mais impostos?

São pontos a serem refletidos. Nem tanto o céu, nem tanto a terra. Tem que haver entendimento sobre a prática e intervenção por parte do CADE ou órgão semelhante, pelo menos para uma primeira análise, com o apoio dos Sindicatos de Cervejas, pois se trata de uma situação crítica ao setor microcervejeiro. Nessas condições, não há competição. O microcervejeiro sofrerá um colapso. É uma situação de urgência.

Por enquanto, vou me adaptando ao ambiente. Vou tomar cerveja, dos amigos, claro. Um brinde!

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